Não sou muito fã de trends, especialmente no mundo do vinho.
Quando algo se torna tendência, muitas vezes significa que estamos atrasados.
É o meio da curva do sino, o ponto onde já não há nada de novo a ser explorado. Eu prefiro estar na subida da curva, antes que tudo vire lugar-comum.
Nos últimos dois anos, uma tendência específica ganhou espaço entre sommeliers, influenciadores e profissionais do ramo: falar mal da Carménère chilena.
Recusar a Carménère virou um clichê para sinalizar conhecimento de vinhos.
Mas, para mim, se você está abraçando essa tendência agora, já está atrasado.
A Questão da Carménère e a Pirazina
Por que falar mal da Carménère? Afinal, não é essa uma das uvas mais procuradas no Brasil e um ícone da viticultura chilena?
Sim, mas o sucesso trouxe problemas. Com a popularidade, muitos produtores começaram a priorizar quantidade em vez de qualidade. Isso resultou em vinhos malfeitos, que prejudicam a reputação da uva. Um dos principais sintomas dessa falta de cuidado é a pirazina.
A pirazina é uma molécula que causa aromas como o do pimentão verde cozido. Ela aparece em diversas uvas bordalesas, como Cabernet Franc, Merlot, Cabernet Sauvignon e, claro, na Carménère. Essa molécula se torna mais evidente em safras frias ou quando há falta de atenção no cultivo e na vinificação.
Grandes propriedades de Bordeaux, Califórnia e também do Chile combatem a presença excessiva de pirazina com práticas como cultivo cuidadoso, poda manual, exposição ao sol e colheita no ponto de maturação ideal. Quando bem feito, a pirazina é sutil e até apreciada por alguns. Mas, em excesso, ela se torna um defeito.
Por Que a Carménère Foi Impactada?
A Carménère chilena ficou associada à pirazina principalmente devido à enxurrada de vinhos baratos que inundaram o mercado. Esses vinhos eram fruto de um processo industrial: vinhas cheias de agrotóxicos, colheitas mecanizadas e precoces, e vinificação repleta de “correções” químicas para ajustar acidez, cor e sabor. O resultado? Uma reputação prejudicada e vinhos com aromas de pimentão verde em destaque.
A Nova Realidade da Carménère Chilena
Apesar desse histórico, a situação mudou. As grandes “fábricas” continuam produzindo vinhos de qualidade duvidosa, mas os produtores renomados do Chile estão há anos elaborando Carménères espetaculares. Esses vinhos quase não lembram os rótulos baratos que mancharam a reputação da uva.
Recentemente, tive a oportunidade de degustar alguns desses novos exemplares:
- Serendipia (região de Peumo): Uma verdadeira joia que mostra como a Carménère pode brilhar. SERENDIPIA CARMÉNÈRE D.O. PEUMO 2017 com 37%OFF
- Tagua Tagua: Degustado na feira Wines of Chile, é um dos melhores que já provei, embora ainda não esteja disponível no Brasil.
- Koyle, de Colchágua: Produzido de forma biodinâmica no vinhedo Los Lingues, é um exemplo de excelência.
- Kai, da Errazuriz: Um rótulo ícone que, em minha avaliação, merece 97 pontos. Depois percebi que James Suckling deu 99 pontos a ele. Simplesmente espetacular.
Esses vinhos apresentam pureza de fruta, sedosidade e uma maciez que rivaliza com os melhores Merlots de Saint-Émilion. A reputação da Carménère foi reconstruída com maestria, e é incrível ver o que está sendo feito hoje.
Um Rótulo para Redescobrir a Carménère
Se você quer provar o que a nova geração da Carménère chilena tem a oferecer, recomendo o Koyle Royale Carménère 2019. Avaliado com 93 pontos no Descorchados (e por mim também), é um vinho que oferece qualidade excepcional por um preço acessível.
KOYLE ROYALE CARMÉNÈRE 2019
Por apenas R$129,90 na compra da caixa, este rótulo traz aromas herbáceos refinados, com notas de pimenta-do-reino, eucalipto, maracujá e até mesmo nuances carnudas. Na boca, é sedoso e macio, com uma suculência que impressiona.
Ao degustar, escrevi em minhas anotações: “lençol de algodão egípcio de 400 fios”. Uma experiência única. Se fosse um Bordeaux, estaria na faixa de R$300 a R$350.
Conclusão
Pode até ser que ainda exista uma tendência de falar mal da Carménère, mas isso não reflete a realidade atual. Os produtores de qualidade corrigiram o rumo, e hoje temos vinhos excepcionais que merecem ser redescobertos.
Aproveite para experimentar e tirar suas próprias conclusões. Tenho certeza de que você irá se surpreender. Prove este Koyle Royale Carménère 2019 e entenda o que estou dizendo.
Abraço grande,
Alykhan Karim
CEO, Sommelier – Sonoma Market