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NYC, a pandemia, Sancerre e Pouilly-Fumé

Quando me mudei da NYC para São Paulo, em 2011, Sancerre já estava em plena ascensão. Cada vez mais o vinho mais procurado dos bares e restaurantes da metrópole norte-americana.

Não é difícil de entender porquê. Diferente da costa oeste dos EUA, onde os vinhos nacionais são preferidos, a cultura de vinho em Nova York sempre foi mais influenciada pela França e Itália. 

Chardonnay da Califórnia? Nem pensar. Sancerre, por sua acidez elétrica, baixo dulçor e diversidade de expressões, vindo dos distintos solos da região (calcário, marga e sílex), tem um apelo natural para os enófilos curiosos da cidade, sempre em busca da nova tendência. 

Mas Sancerre superou as expectativas de todo mundo. Ascendeu ao trono e ficou, sem olhar para trás. 

Hoje é estimado que entre 15% – 20% da produção inteira da AOC, a mais importante do Loire, é destinada a Nova York (Gilles Crochet, da excelente Domaine Lucien Crochet, contou para mim que no ano passado 30% da sua produção foi destinada para seu distribuidor no Tri-State area, que engloba Nova York, Nova Jersey e Connecticut).

“Não consigo oferecer Sancerre pela taça,” contou o sommelier-chefe dos venerados Bar Boulud e Boulud Sud, numa entrevista para o Wall Street Journal. “Não conseguiria vender mais nada. Aliás, descrevo outros (vinhos) brancos como “parecidos a Sancerre” para poder vendê-los”. 

Agora, neste ano de pandemia, o resto dos EUA começou a seguir o exemplo da cidade de Nova York. A revista Fortune publicou uma matéria em meados de Julho divulgando que a Sauvignon Blanc tinha virado o vinho da pandemia. Citou a Nielson: um aumento em 38% de consumo de Sauvignon Blanc comparado ao mesmo período do ano anterior, liderado principalmente por Sancerre.  

Será que Brasil será o próximo grande mercado para o vinho? 

Espero muito, adoro o vinho. Mas não sei. Sancerre já não é muito acessível nos EUA e na França, versões de produtores bons geralmente superam os R$30 ou €30. Aqui no Brasil é quase impossível achar Sancerre de alta qualidade abaixo das R$400. 

Também, a maioria dos enófilos aqui no Brasil não conhecem o vinho e poucas importadoras trazem. 

Uma pena! Junto com os vinhos da sua AOC irmã, Pouilly-Fumé, há poucos quilômetros de distância no outro lado do rio Loire, são “as melhores expressões de Sauvignon Blanc do mundo,” nas palavras do Eric Asimov, crítico da New York Times. 

Um fato que acho interessante é que aqui no Brasil é a Pouilly-Fumé que é mais conhecida das duas regiões alma gêmeas. Um pouco mais frutado do que os Sancerre, que tendem de ser mais sutis (como regra geral, isto varia muito entre safras), a verdade é que os vinhos são de qualidade muito semelhante e de solos parecidos. Muitos dos grandes produtores de Sancerre fazem Pouilly, e vice-versa. Veramente, em uma degustação às cegas, seria difícil para 8/10 sommeliers distinguir entre os dois. 

Veja este vídeo de uma degustação dos dois para entender mais

https://youtu.be/qmKnzooG3JY

Umas dicas para ajudar você?

  • Sancerre, por conta da elevação dos vinhedos, tende de ter uma acidez maior e fruta menos exuberante do que Pouilly-Fumé, cujos vinhedos são localizados no nível do mar e portanto são mais impactados pelo calor, com uma maturação mais rápida das uvas. Sancerre, portanto, tende de mostrar uma certa elegância maior com fruta menos madura, enquanto Pouilly pode ser mais generosa com frutas cítricos mais robustos e até fruta de caroço nas safras mais quentes.
  • Pouilly-Fumé AOC vinhos passam 6-8 meses em contato com as leveduras, enquanto em Sancerre o costume é 3-4 meses. O maior período de contacto permite o Pouilly-Fumé mostrar mais corpo (e pode contribuir para melhor evolução na guarda, porém varia muito produtor a produtor). 
  • Justamente por conta da fruta mais madura e maior tempo de contacto com as leveduras, Pouilly-Fumé poderia ser um pouco mais escuro na taça com a uma graduação alcoólica um pouco maior. 

Hoje a Sonoma tem a oportunidade de oferecer alguns exemplares destes grandes vinhos brancos, através da nossa curadoria própria na França. 

Recém chegados ao Brasil (Novembro de 2020), são lindos para abrir no verão agora ou para deixar por alguns anos na adega, todos evoluirão com sucesso.

Serge Dagueneau Tradition Pouilly-Fumé AOC 2018

Os vinhos da família Dagueneau são os maiores representantes da AOC Pouilly-Fumé, os da falecido Didier Dagueneau são entre os vinhos “cultos” mais procurados do Loire. O Pouilly desta propriedade foi produzido pela família do tio do Didier e mostra toda a nuance e exuberância da Sauvignon Blanc neste terroir. 

Notas de frutas exóticas, como maracujá, lichia e manga, com notas cítricas, minerais e de flores brancas seduzem o olfato. No paladar, vibrante acidez e frescor. Raspas de limão siciliano, lembranças de calcário e uma exuberância brilhante se destacam, junto com corpo e complexidade. Elegante e profundo, entrega ainda oferece bastante mineralidade e presença

92 Pontos

 

Jean-Max Roger Sancerre “Marnes de Caillot” 2018 

A família Roger cultiva vinhas e faz Sancerre desde o século XVII, mas somente nos últimos 20 anos, abaixo da gestão do Etienne Roger, que esta pequena propriedade de 4 hectares expandiu para 26 hectares e começou a brilhar com intensidade, em uma região repleta de excelentes vignerons. Este é o cuvée principal da casa. 

Em taça tão branco que remete Chablis (veramente, os solos são os mesmos). Traz aromas de frutas brancas frescas, como pêra e lichia, com toques cítricos, flores secas de camomila e uma mineralidade invejável. Complexo no palato, tem acidez boa (mas não tanto quanto o vinho da 2017). Com notas cítricas, límpidas e minerais. É bem estruturado e fresco, com boa intensidade de sabor, onde frutas cítricas invadem a boca e terminam num final com um toque azedo de limão. Tem boa mineralidade, frescor e um finalzinho de fruta de caroço.

91 Pontos

 

Jean-Max Roger Sancerre Vieilles Vignes 2017

De cor amarelo claro, no nariz se destacam as frutas cítricas, exuberante mineralidade e um delicado toque de mel. Um leve iogurte leva a entender que passou por fermentação malolática. No paladar, preenche a boca com delicioso frescor e maravilhosa acidez, em meio a uma deliciosa concentração de sabores, de raspas de limão siciliano e pedra quebrada, a influência do calcário tão especial nesta região. A presença do carvalho é sutilmente perceptível, uma leve tosta que não esconde o frescor, elegância, equilíbrio e notável persistência em boca. 

A profundidade neste vinho é lindo, este um Sauvignon Blanc para decanter (ou deixar 10 anos na adega). Acho este dos melhores vinhos brancos da nossa curadoria atual.

94 Pontos 

 

Jean-Max Roger Sancerre Rouge “Cuvée la Grange Dimière” 2015

Uma raridade por natureza, ainda mais aqui no Brasil, um 100% Pinot Noir nascido nos famosos solos de calcário kimmeridgiano da região. 

Em taça, traz uma cor vermelho vivo, com reflexos acobreados. No nariz é intenso e remete a frutas vermelhas como cereja, amoras e amoras, com um pouco de canela, mentol e ervas secas. Tem ainda nuances de fumaça e carvão. Em boca, se mostra macio, com notas terrosas e minerais. Sóbrio e sem nenhum dulçor, a textura dos taninos desenvolve-se progressivamente e expressa um excelente final em boca. Um Pinot Noir para quem busca as versões alsacianos ou de Pfalz, muito semelhante.

91 Pontos

 

Obviamente não é somente a Sonoma que oferece excelentes versões destes vinhos. A Pascal Jolivet, produtor biodinâmico, faz tanto Pouilly-Fumé quanto Sancerre excelentes, valem a pena procurar. Gosto muito do Sancerre Le Chêne Marchand do Lucien Crochet, também os da Ladoucette. Para Pouilly-Fumé, além dos Dagueneau, Fournier e Domaine des Berthiez são grandes nomes da região.

Difícil dar errado com estes vinhos. 

Boas degustações!

Alykhan Karim

Blog Sonoma Market

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