Mas outro animal me chamava a atenção: os patos, ou, como eles chamam, “canards”.
Era confit de canard pra cá, cassoulet de canard pra lá, magret de canard, canard à l’orange, foie gras… O TNS Sofres (órgão de estudo de marketing e opinião) fez um estudo sobre o prato preferido dos franceses e, voilà, venceu o pato. Franceses comem muito pato! Quando não é pato, é ganso, que é parente próximo. Será que esses bichos também eram antigas pragas?
Lá vou eu xeretar na História. E achei muita coisa interessante!
Fígado de pato
Vou começar pelo foie gras (traduzindo literalmente, “fígado gordo”). O foie gras é uma iguaria francesa muito apreciada e polêmica, feita com fígado de pato ou ganso. E (pasmem) sua origem não é a França, e sim o Egito.
Há uns 3 mil anos a.C., os egípcios perceberam que os gansos selvagens que imigravam para o Nilo tinham o fígado muito maior, mais gorduroso e com uma textura diferente dos fígados de outros gansos. Depois de muita observação, viram que o motivo era que os gansos que imigravam tinham se entupido de comida para aguentar o inverno, e isso afetava seus fígados. Descoberto isso, os egípcios começaram a desenvolver a engorda das aves.
Daí, a prática se espalhou nos êxodos judaicos, sendo bem desenvolvida, já que os judeus precisavam de gordura e não ingeriam porco. Depois disso, o foie gras (que ainda não tinha esse nome) virou ícone nos banquetes da Roma Antiga, sendo servido com figos. Aliás, a palavra “fígado” e “foie” derivam do latim “ficatum”, que significa figo!
Anos depois, a Gália (que se tornaria a França) tornou-se expert na engorda dos patos, e o foie gras (que, aí sim, ganhou esse nome) virou base da alimentação camponesa nos séculos 17 e 18, para aguentar os frios rigorosos. Com o passar do tempo, foi sendo apreciada por reis, como o Louis XVI, e virou sinônimo de comida requintada.
Há muitas controvérsias sobre a produção do foie gras, principalmente pelos defensores dos animais, mas alguns produtores se defendem dizendo que superalimentar o pato não causa dor nem estresse no animal. Controverso ou não, uma mãe de família francesa me falou, um dia, que Natal sem foie gras não é Natal!
E o resto?
Ufa! Se só o fígado já deu toda essa saga, imagine o pato inteiro! Calma, eu prometo que vou resumir.
Grande parte da gastronomia francesa veio da época medieval. Devido ao grande tráfego de soldados pela Europa, (e, com eles, produtos e comidas de outros lugares), o rei Louis XIV começou a ficar com medo que a culinária internacional arruinasse a culinária local. Então, decretou que estava proibido comer ingredientes ou pratos importados. Nada democrático, mas isso transformou a França num dos países de gastronomia mais rica e exclusiva, pois foi obrigado a se desenvolver apenas com seus frutos frescos, seus peixes, carnes e aves.
A carne, em toda a Idade Média, era coisa extremamente luxuosa, comida apenas em dias de festa e olhe lá. Muitos camponeses nunca viram carne nos seus pratos, e muitos períodos foram marcados pela fome extrema. Sendo a carne algo tão apreciado, era de se esperar que animais selvagens fossem alvo de cobiça. Afinal, estou morrendo de fome, nunca provei carne, pois é comida de rei, e de repente aparece um pato gordo no lago perto de casa…
E foi assim que o pato entrou no cardápio.
Daí pra frente, foi só alegria. As variações do pato na culinária francesa foram surgindo durante todos esses séculos. E a única forma de você saber do que eu estou falando é experimentando.
Deixo você com uma receita de confit de canard e uma sobremesa com foies gras. Bom pato (ops, prato)!
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