Anos depois, a atividade foi interrompida por conta de conflitos entre as coroas de Portugal e Espanha, que acabaram por expulsar os jesuítas da região.
A produção renasceu em 1974 com a chegada da Almadén, subsidiária da empresa americana National Distillers. Em 1978, foi a vez de Juan Carrau fincar raízes por lá, trazendo a experiência de suas origens espanholas e como produtor em Caxias do Sul desde 1968 (no Château Lacave).
O grande desenvolvimento da região se deu de 1995 a 2012. Segundo o Cadastro Vitícola da Embrapa, nesse período, 1,3 mil hectares foram ocupados por vinhedos. Hoje, com dois mil hectares, a região já é a segunda maior produtora de vinhos finos do país, atrás apenas da Serra Gaúcha, e contando com 15 projetos distribuídos por 11 municípios – os produtores já se organizaram em torno da Associação dos Vinhos da Campanha com o objetivo de aprimorar a produção, promover ações de divulgação e também buscar o reconhecimento como Indicação de Procedência (IP).
O terroir: para quem não conhece, a Campanha fica no sudoeste do Rio Grande do Sul, na latitude 31O, e faz fronteira com o Uruguai. É uma região de planícies, marcada por coxilhas e cerros, como o do Chapéu e de Palomas, pequenas elevações na paisagem que não passam dos 300 metros de altitude.
A atividade econômica tem como base a criação de gado bovino e ovino, e o cultivo de arroz e soja. ]
Os solos são arenosos e tem boa drenagem.
O clima é favorável, com estações bem definidas, invernos frios e úmidos, atingindo temperaturas negativas, com incidência de neve. Os verões têm dias quentes e noites frescas, gerando boa amplitude térmica. A média anual de chuvas é de 1.200 milímetros, mas com a vantagem do maior volume ocorrer no inverno, período em que as vinhas hibernam.
Todas as videiras são de “vitis vinífera” e plantadas em sistema espaldeira.
Esta combinação de condições naturais favoráveis faz com que as uvas amadureçam plenamente, desenvolvendo maior teor de polifenóis e açúcar nas uvas. Isso significa que os vinhos têm mais estrutura gerada por maior teor de álcool e taninos, características que se enquadram nos padrões estabelecidos atualmente pelo mercado para vinhos de qualidade, e que faz a Campanha ter os olhares voltados para ela.
Outro fator considerado positivo na região é que sua topografia plana favorece o trabalho mecanizado, diminuindo custos com mão de obra e representando preço final menor nos vinhos. É da Campanha, então, que poderão vir vinhos com melhor relação qualidade-preço para satisfazer um público que tanto reivindica por vinhos brasileiros mais baratos.
O futuro e o presente
Falamos de futuro, mas se observarmos a Campanha mais de perto vamos perceber que parte deste futuro já é realidade. Quem foi à Expovinis 2015 pode provar e comprovar que os vinhos esbanjam qualidade e tem preços convidativos. Os que visitaram o estande da Cordilheira de Santana puderam, inclusive, constatar que a Campanha também é capaz de produzir vinhos de longa guarda. A vinícola, que este ano celebra 15 anos de produção, traz três vinhos da histórica safra de 2005, Cabernet Sauvignon, Tannat e Chardonnay, cheios de vitalidade e com uma qualidade incrível. A propósito, estas variedades já se mostram muito bem adaptadas por lá.
Já é realidade também o trabalho que está sendo feito pela Associação dos produtores para divulgar seus vinhos. Começa neste mês de maio em São Paulo uma série de ações de degustação para apresentação dos vinhos ao público consumidor.
O futuro irá representar, então, o aprimoramento de um trabalho que já nasceu bom, com a consolidação de sua identidade. Com certeza, o nascimento de novos projetos inspirados pelos bons resultados já conquistados. Mas que não se espere por vinhos padronizados, porque a Campanha vem para ser Campanha e não quer limites para o seu desenvolvimento. O projeto de Indicação de Procedência (IP), neste primeiro momento, pede o reconhecimento como região, mas sem limitar as variedades de uva, pois os produtores entendem que ainda há muito que ser revelado por lá.
Nem melhor nem pior, diferente
Penso apenas que é preciso tomar cuidado para não vender a ideia de que este é o único futuro para vinhos brasileiros de qualidade, como se não houvessem outras fronteiras e se ainda não tivesse sido produzido nenhum. O perigo é o de se criar mais uma daquelas verdades que se tornam padrões rígidos de consumo, determinando que vinho brasileiro de qualidade é o da Campanha, e nenhum outro mais. Isso não é saudável para uma cultura do vinho que naturalmente é a da diversidade.
Há muitos futuros neste grande país, sejam novas regiões, novas variedades, ou até mesmo o resgate de antigas castas em áreas tradicionais como a Serra Gaúcha, além de regiões esquecidas como a dos Sete Povos das Missões.
Por enquanto, vamos provar e desfrutar das delícias da Campanha Gaúcha. O futuro será de todos os que se propuserem a produzir o seu melhor.